sábado, 2 de fevereiro de 2013

Da reciprocidade...

 "A pintura é poesia sem palavras."
Voltaire
"Você está diferente'' - disse a pessoa que a fez mudar. E um olhar cabisbaixo parecia expressar tudo aquilo que se passava dentro daquele coração cansado e bobo. Olhou rapidamente para o lado, não queria revelar assim, tudo o que há tempos vinha a sentir; ele então trocara de lugar , buscou seu olhar e novamente questionou: "Você está diferente". Agora, olhara para baixo, e a vontade era de enfiar a cabeça no chão, para que não pudessem interpretar o que estava se passando, para que a deixasse ali com seus sentimentos e pensamentos tolos. Queria esquecer. Queria lembrar. Queria esquecer novamente. Nem sabia o que queria e se de fato ainda queria. Ficaram em silêncio por alguns minutos, o olhar era covarde demais para que pudesse encarar aqueles olhos tão doces, porém tão vazios; as palavras vinham até a boca, mas não se libertavam, tão pouco permitiam-se, arredias, voltavam para a garganta, e assim formavam uma bola de neve dentro do peito. 
Respirou fundo e enfim dera as costas, talvez com a intenção de que viesse atrás, que a chamasse de volta, que gritasse ao menos aquela vez por seu nome. Caminhava devagar e sem um rumo certo, o passo era lento e pesado, o corpo comandava, e a alma, sabe-se lá onde andava.
 Pensou diversas vezes em olhar para trás, não conseguira. Pensou em gritar, no mesmo tom em que os sentimentos gritavam dentro de si, quem sabe assim a ouvisse, ou até mesmo entendesse tudo aquilo que a tanto tempo lhe secava a garganta e apertava o peito.
"Você está diferente", foi a única frase que ouvira o caminho inteiro, inúmeras e repetidas vezes, cada vez que a mesma se repetia, pensava: "E você, não esteve indiferente esse tempo todo?"- lembrava das inúmeras conversas jogadas fora, dos olhares não correspondidos, daquele tremor nas pernas e frio na barriga todas às vezes que o via; do tempo que levava ao escolher a roupa adequada antes de se encontrarem, ou de quantas vezes olhou-se no espelho, mudou o cabelo, ensaiou o que falar e como falar...em vão.
Sempre ouvira muito e falara pouco. Sempre sentira muito. Sempre sentira só. Foram tantas as vezes que sonhara e acordara com o desejo de voltar a dormir, para que assim quem sabe, pudesse também voltar a sonhar. Foram tantas as vezes que desejou sair do sonho e de fato realizar. 
Mas não, não houve se quer vontade de responder a aquela dúvida afirmativa, era tudo tão óbvio, não haviam razões para se explicar, há situações que realmente não precisam ser explicadas. Seguiu caminho, seguiu a vida, abraçou o destino, sem precisar tirá-lo do sonho.

Se para bom entendedor, meia palavra basta,  para um coração perspicaz meio sentimento está de bom tamanho.
         É uma pena que nem todos os corações sejam perspicazes.


Acho que é tempo de desistirmos
E descobrir o que está nos impedindo
De respirar facilmente e conversar direito
O caminho é claro se você está pronto agora
O voluntário está se acalmando
E tirando um tempo para salvar a si mesmo


Achei lindo demais esse poema do meu amigo Gilmar Teixeira

Fevereiro 02, sábado ainda

Não tenho certeza de nada
Ando destemperado
Exposto à luz da alma

Não tenho certeza de nada
Encontro cadeados sem chaves
Perdidos à beira da estrada

Não tenho certeza de nada
Sinto a garganta apertada
Te aprecio em vão

Não tenho a certeza de nada
Se sou muitos
Se sou multidão

Não tenho a certeza de nada
Apenas tenho mais sorte
do que razão

certezasorterazãocerteza

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Se você me quer...



                     "Do outro lado da rua havia uma loja de discos. O alto-falante tocava música pra mim. Tudo parecia tão calmo e tranquilo lá fora. Ficava ali parado, de pé, tentando lembrar o que poderia ter feito. Sentia vontade de chorar, mas não saía lágrima alguma. Era só uma espécie de tristeza, de náusea, uma mistura de uma com a outra, não existe nada pior. Acho que você sabe o que quero dizer. Todo mundo, volta e meia, passa por isso. Só que comigo é muito frequente, acontece demais." 
Charles Bukowski




                                                                                                                   If You Want Me

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Já faz tempo eu vi você na rua, cabelo ao vento, gente jovem reunida, na parede da memória, essa lembrança é o quadro que dói mais...


             E o domingo amanheceu triste. Nossos corações apertados. Nossas almas tristes. Em dias como estes, não se tem vontade de fazer muita coisa, o corpo se move, mas a cabeça paralisa, não consegue acompanhar; A gente fica meio zonzo, são muitos pensamentos, reflexos, lembranças, suposições... Quem no dia de hoje não se pôs no lugar de algum daqueles jovens? Quem não lembrou de alguma vez que a mãe tenha ligado pra saber se estava tudo bem, ou a que horas chegaríamos em casa; quem já não ouviu: "Leva um casaco, pode esfriar", "Se beber, venha de táxi pra casa". Sim, são frases um tanto repetitivas, sim, este texto é clichê. Não, não é um texto apelativo, muito menos estou engajada em alguma "campanha" de alerta aos jovens, tão pouco escrevo para dar lição de moral em alguém; Apenas reportei-me a todas essas ocasiões também já vivenciadas por mim. Apenas me entristeci diante de tal catástrofe. Meu peito esteve doído durante todo esse dia 27 de janeiro, um aperto tão grande capaz de causar nó na garganta e uma vontade demasiada de chorar a qualquer momento. Não conhecia nenhuma das vítimas, tão pouco suas respectivas famílias, estive poucas vezes em Santa Maria, e conheço pouco a cidade também; Mas pude sentir daqui, a tantos quilômetros de distância, tamanha dor e angústia sentida por todos aqueles que tiveram o coração dilacerado por todas essas perdas absurdas e irreparáveis. Fico me perguntando, e agora, como vai ser? Como esses pais órfãos tão prematuramente de seus amados filhos, continuarão a viver? Quisera nós, pudéssemos abraçar cada pai, mãe ou irmão neste momento, quem sabe diminuir um centímetro de dor, ou pelo menos poder olhar nos olhos destas mesmas pessoas e dizer "eu sinto muito!"
 Vos digo, me de dói pensar sobre isso, embora seja inevitável.
Não sinto vontade de reclamar de nada, nem de ninguém, apontar culpados neste momento, pra que? Reclamar por que uns sentem menos, e outros mais, pra que? Entendam, as pessoas são diferentes, os sentimentos são diferentes.  Há quem se importe com o adiamento de determinada festa, que se limite a pensar que esta lamentável situação não tenha relação alguma com tal evento, que a vida segue e que não há motivos para "interferir" na vida de outras tantas pessoas por algo que já aconteceu; Mas há também, os que passaram o domingo inteiro consternados diante de tal tragédia, que dormiram mal, acordaram mal, seguiram sim suas vidas, porém abalados, encolhidos e tristes. Estes, assim como eu, não estão dando importância para a casa que haviam reservado na praia, nem para as férias que foram programadas justamente para próxima semana, devido aos supostos eventos; estes, não vêem a mínima graça em festejar um inicio de fevereiro, quando o fim de janeiro fora tão triste. Estes, estão doídos com a dor do outro. 
A gente sente sim, muita indignação por tudo isso, se questiona, tenta entender, não vê coerência nos fatos; sente uma imensa revolta por tamanha injustiça. Irresponsabilidade de alguns, negligência de outros, insensibilidade de muitos...não há palavras ou sentimentos que cheguem a tempo. Não há lógica, nada ameniza, há dores que são incuráveis, feridas que são para sempre.
 Serão sorrisos nunca mais vistos, abraços nunca mais sentidos, e assim a vida vira lembrança, e as lembranças por sua vez, viram saudade.

27/01/2012, dia em que a Terra amanheceu cinza e o céu cheio de luz.

Muita força, muita paz...

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Das tentações...

"Se chorar, chorar é vão, porque os dias vão pra nunca mais..."


E a gente tenta...
Tenta ser feliz e fazer os outros felizes
Tenta fazer ninguém chorar e não deixar ninguém te ver chorar
Tenta não deixar o creme dental cair da escova de dente, e tenta nunca esquecer de levar a mesma
Tenta parecer menos bobo diante de quem se gosta, e tenta ser a gente mesmo diante dessa pessoa.
Tenta segurar o riso quando não se pode rir, e tenta rir daquela piada tão sem graça que seu amigo contou.
Tenta ser mais paciente com o seu cachorro que roeu os fones de ouvido, e tenta não mimá-lo tanto de vez em quando...
Tentar ver menos Tv e ler mais livros, e acaba lendo mais Tv e assistindo esses mesmos livros jogados pela estante.
Tenta reclamar menos de coisas tão pequenas, e acaba amargurando um dia inteiro,por ter enfiado o pé na poça d'água.
Tenta ter mais tempo para si, e tenta saber o que fazer com esse tempo vago.
Tenta parar de reclamar do frio, do calor e tenta falar mais sobre borboletas e ursos polares.

E a gente tenta entender e se entender...
e se pergunta o por quê de algumas pessoas simplesmente, não tentarem!

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Sentimental, Los Hermanos


Sobre a coragem (ou a falta dela)

Para ler ao som de Los Hermanos, Sentimental
"O abismo que é, pensar e sentir..."

Entrou no carro decidido, vou acabar com essa droga! Ligou o rádio e procurou a estação mais triste, onde tocasse a música mais melancólica, dessas que fazem doer a alma sabem?Respirava fundo, ofegante, bem rápido e tão alto que mesmo com o volume no máximo, conseguira se escutar. O peito parecia oco, e ao mesmo tempo pesado, dormente, doente...
Andou muito, correu tudo que pode, mas os pensamentos superavam qualquer que fosse a velocidade, vagavam por lugares obscuros, embolavam-se, engalfinhavam-se, contradiziam-se...
Dirigiu então até um enorme penhasco, cercado de rochas  e contornado pelo mar, parou o carro metros antes, desceu e correra em direção a beira do abismo, a intenção, com toda a certeza, era atirar-se, dando fim a todos os problemas, dúvidas ou mágoas que o cercavam e atormentavam por muito tempo. Quem sabe houvesse uma vida melhor após a morte, quem sabe pudesse recomeçar do zero, fazer diferente, ou até mesmo fizesse diferença na vida de alguém, já que há tanto, o sentimento que predominava era de inutilidade e desprezo de si.
Correra tão depressa, que a velocidade fez com que seu corpo não conseguisse travar diante do precipício, resvalou e caiu sentado, em terra firme, mas com os pés quase que no ar, fazendo com que algumas pedras se desprendessem e caíssem vagarosamente, desaparecendo na imensidão, mergulhando levemente naquele mar, tão belo, porém tão tempestuoso e revolto. Quando a poeira baixara, olhou num misto de pavor e euforia para o próprio corpo, primeiro mãos e braços, depois pés e pernas; tocara em seu rosto para que pudesse sentir a respiração e ter a certeza de que realmente estava vivo; o coração parecia saltar-lhe pela boca a qualquer momento, tremia sem parar, suava frio.
Assim, permaneceu por alguns minutos, sentado, tentando entender o que de fato havia acontecido, espiou mais uma vez o mar, esticando somente o pescoço, quase que sem se mexer; levantara então bem devagar, limpara as mãos, batendo uma sobre a outra, as mesmas encontravam-se escalavradas devido ao impacto, mas dor era sentimento pequeno, que passara desapercebido perante o acontecido. 
Entrou no carro, desligou o rádio e foi embora. Covardia? Arrependimento? Quem sabe... O fato é que, descobriu, naquele instante, que o medo da morte era bem maior do que o de encarar a vida. 
Decidira então, por fim, viver.